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sábado, 11 de janeiro de 2014

VAMOS?

Ontem deixava esta foto no Facebook, anunciando que em breve estaria a assistir a um concerto.
Alguns minutos antes, a artista que se apresentava chama-me para me cumprimentar e confessar que me incluía neste dia de celebração (15 anos de carreira) como uma referência de inspiração e impulso à sua vida artística.
Estranha e generosa simpatia, esta sua permissão à minha entrada no seu ritual de preparação para um concerto, que qualquer artista vive, tanto mais que na era das concentrações “metabólicas” antes de actuar, muitos entram em alfa uma semana antes e duram dias a seguir aos concertos, numa espécie de paragem do tempo, que esquecemos de pôr a contar de novo… 
Primeira lição aprendida, é o que vos revelo para já.

Segunda lição. O evento teve direito a discursos, pela particularidade de encerrar a exposição  de Cristina Rodrigues no Museu Nacional de Arqueologia e por entre muitas coisas pretender simplesmente celebrar a portugalidade, a etnografia, a nossa cultura com verdade e talento. Os discursos, que têm por habitual condão arrepiarem-nos os ponteiros do relógio e as bordas da paciência, foram os primeiros a dar o mote principal: falar o necessário,  reconhecer o valor da intenção de fazer algo de valor e, ineditamente, abrir a atmosfera a um momento cuja comoção começou ali. Tudo porque os “discursantes” tiveram o dom de, ao invés de se ofuscarem mutuamente, como já muitas vezes assisti, irem abrindo as portas uns aos outros, com simplicidade, reconhecimento, generosidade e consciência do objectivo que serviam naquele momento. Muito bonito.

E o concerto arranca, explosivo, pronto, inteiro e revitalizante, e para mim, que nesses momentos me esqueço da unidade enquanto artista e me torno parte de cada segundo do que se passa no palco, tornou-se uma viagem que agradecerei por muito tempo. E que, retribuindo o cumprimento de quem me quis cumprimentar a poucos minutos de arrancar o seu espetáculo, talvez seja a razão de hoje regressar à escrita e a esta partilha.

Isto porque certos momentos nos devolvem a urgência do que conta. Do que realmente conta. No meu percurso tenho assistido à conversa de bastidores que invariavelmente nos fala de certos fenómenos serem fruto das máquinas, dos marketings, dos lobbys, dos bobbyes, e de coisas que não devo escrever. A mim, perguntam vezes sem conta se acho que tenho tido o apoio que mereço e se tenho o reconhecimento que devia e quando vivo estes momentos condensados de Verdade percebo que o verdadeiro poder não vem do que convenientemente queremos pensar e comodamente usamos até de expiador para a nossas não concretizações. E vamos à terceira lição...

A sala onde estive era tudo menos uma sala de espectáculos tradicional e “com cachet”. Estava cheia. A abarrotar. Com pessoas de pé e nem uma se queixou. Os fotógrafos que vi seriam com certeza profissionais mais por conta própria do que de revistas sem razão própria. O apoio que pude perceber, da rádio de sempre, para a música portuguesa, (Antena 1 e o seu Edgar Canelas) não serão dos tais que se perdem em perguntas: “mas a menina é mesmo fadista? Ou é o quê?”, ou “fadista colorida” como confessava a própria Ana Laíns, que por agora já devem ter percebido ser a artista que fui ver.  E que se confessava irremediavelmente demasiado faladora e com o coração na boca. E graças a Deus, ou a ela, assim é.
Para quem quisesse aprender a cartilha de como criar uma carreira, um nome, um público, uma Luz própria sem entrar nos meandros do poder, este era o dia. A fidelidade do público a cada nota, a cada arranjo, a cada músico (impecavelmente preparado e entregue), a cada palavra, conquista-se, sem duvida. Mas também nalgum momento o publico teve de ir ao encontro e militantemente acompanhar. Deve ser o que chamam de cumplicidade e arrepia assitir.

E esta lição que recebi e tanto agradeço não serve apenas para reconhecer esta incrível artista que só agora descubro mais profundamente e por isso me confesso - confio que este reconhecimento não te irá, Ana, tornar alvo de nada que não tenhas já a estrutura para te protegeres e seguires Livre e Feliz, como dizias;-).

Serve para eu própria regressar a uma Verdade que permiti que o cansaço e a contaminação do meio influenciassem – a voz transforma-se com os anos, mas a Alma pode crescer e é essa mistura que fará a Identidade com o publico se identifica.

Serve para insistir na visão que tenho do que tenho para dar, do quero fazer e do que é possível fazer, porque é mesmo possível fazer-se tudo – querendo...

E serve, finalmente e muito mais importante, para nos desafiar a mudarmos HOJE
, agora e para sempre a nossa educação cultural, a nossa atitude na nossa sociedade e o nosso dever para com a nossa existência que nos tornará merecedores cada vez mais dos melhores direitos:

ASSISTIR A “MÚSICA VIVA” CADA VEZ MAIS (não se iludam, nenhum youtube, arte pirateada ou mesmo comprada ou meio de divulgação alcança a realidade e energia do VIVO);
ENCHER OS TEATROS, AUDITÓRIOS E QUALQUER LUGAR QUE TENHA A CORAGEM DE APRESENTAR ARTE AO VIVO;
LEVAR A FAMILIA, AMIGOS, AMANTES, RECÉM-CONHECIDOS, DESCONHECIDOS, TODOS,  A ASSISTIR A EVENTOS CULTURAIS DIVERSOS;
ABRIRMOS-NOS ÀS NOVIDADES SEM PRECONCEITOS OU MEDOS;
SERMOS ACTIVOS NA CRITICA REAL E CONSTRUCTIVA PARA QUE A ARTE PORTUGUESA POSSA CRESCER E EVOLUIR;
SABER QUE O PODER DE DIVULGAR A ARTE E DELA DISFRUTAR É NOSSO E NÃO DAS ESTRUTURAS;
AMAR A ALMA QUE TEMOS E CELEBRA-LA NA SUA DIGNIDADE, RIQUEZA E PLENITUDE.


Vamos?!

2 comentários:

  1. Lindo o seu texto, Mafalda. Também lá estive ontem e conheço os palcos e sinto cada palavra sua como força. A Ana enriquece-nos a vida.

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  2. Obrigada, Pedro, pelas palavras. Apenas "transbordei" o que recebi… E acredito que é reforçando estes valores que vamos criando outra visão do nosso orgulho nacional.

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