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quinta-feira, 16 de janeiro de 2014

BOM DIA. OU BOA TARDE. OU BOA NOITE

Acho sempre que o granizo é chuva divertida...

Assim como os bocadinhos de turbulência nos aviões animam as viagens que se podem tornar algo monótonas se tudo passar sempre embalado naquele ruído das turbinas, que se entranha e só sai dias depois. Normalmente, já depois dos concertos terem acontecido...
Claro que não incluo neste comentário pessoas que tenham medo de viajar de avião, o que muito respeito. Mas se contar alguns apertos de mão que já tive de emprestar a passageiros em pânico ao meu lado e, porque se comprova que a turbulência não foi mais do que isso já que sempre cheguei bem a terra, então estes são para a turbulência o que o granizo é para a chuva: divertidos. E quase sempre levam a alguma conversa que ajuda a passar a viagem e a quebrar alguns preconceitos sobre conhecer desconhecidos em momentos ou lugares insólitos.

Quase sempre serão pessoas que nunca mais vemos ou encontramos na vida, porque apesar da era da comunicação generalizada, onde só não comunica quem não quer, há certos encontros que têm esse quê de instantâneo, memorável, transformador... e simples. Seres que não precisam conquistar o momento em trocas telefónicas, ou gravar cada segundo em fotos para partilhar, nem contar a vida toda nos poucos momentos que dura essa descoberta, nem ficar a pensar se terão conhecidos e deixado fugir uma das suas possíveis almas gémeas (pois, parece que o mito de uma só é realmente redutor...).

Quem diz no avião, diz em qualquer outro lugar, situação, acontecimento, desde que haja a abertura a esse fenómeno que mistura a divertida impressão do granizo com a excitação reveladora da turbulência dos aviões (tenho de dar sentido ao principio do texto...). Aquilo de que falo são talvez fracções de segundos em abrimos os sentido e a rotina ao que se passa à volta e reagimos antes de pensar, com a verdadeira natureza do nosso ser e com o impulso de estabelecer contacto.

Imaginem as passadeiras rolantes dos centros comerciais. Passar por alguém e sorrir antes de comandar o sorriso. Imaginem uma caminhada solitária onde se cruzam outros solitários e onde se descobrem por vezes pessoas com a solidão às costas, em vez de ar no peito. Quantas vezes só o simples olhar leva a descobrir que alguém os viu. Ou que fomos vistos. E confirma-se que existimos...
Outra que adoro: guichets, caixas registadoras, bilheteiras de qualquer tipo e o impulso cada vez mais em extinção de cumprimentar com um vibrante bom dia. Boa tarde. Boa vida. E de não esmorecer se o retorno for “humm! Ah, pois...”. Ou o vazio... Conheço um mestre nesta arte, Ramón Maschio. Do alto do seu metro e sessenta e muitos
agiganta-se em qualquer uma desta secções num sonoro e cantado cumprimento. Que agita até os mais impenetráveis, em qualquer lugar do mundo e no seu argentino internacional, e de repente tudo mudou na sala, no espaço, no lugar...

Hoje falo talvez de dormência crónica, a que resisto diariamente e em especial no Inverno e que por épocas me domina mais do que gostaria de perceber. E de como o granizo que há pouco vi cair ajuda a acordar e a saber que também nos invernos da vida, há Vida. E que essa se pratica nas fracções de segundo onde sem julgamentos, consequências, responsabilidades ou deveres podemos contrariar os medos de chegar aos outros, sem com isso arriscarmos a extinção. Ou o ridículo, que tanto tememos, nós os portugueses. Ou o erro de cálculo de não entendermos que andamos todos ao mesmo, no mesmo “barco”. E de simplesmente nos cumprimentarmos e reconhecermos por isso...

Se daqui a um bocadinho passar por vocês e não vos cumprimentar... digam-me, ok?

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