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segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014

SER-SE

Enquanto entro neste novo mundo da escrita e deste blog, surgem-me por diversas vezes sinais curiosos de uma mudança em alguns dos meus “funcionamentos”, algo que veio acontecendo de forma subtil e, de repente, como se explodisse por impossibilidade de contenção, tomou conta da minha expressão, de forma natural, pacífica e tranquila.

Acho que se trata de um estado que há alguns anos procurava reencontrar, que não sendo de impulsividade (a qual reconheço ter, de sobra...) é antes, neste caso particular, de naturalidade. A tal “coisa” de se ser o que se sente, o que apetece, o que acontece, o que sai. O que nos revela em verdade e transparência. No que é de revelar. Nos aproxima de quem se revê nessa realidade. E quem sabe contamina uns poucos a um exercício parecido.

Julgo que se chama transparência. E nesse estado, que resulta provavelmente de se diminuir uma percepção exacerbada que vamos criando sobre nós próprios, fruto do nosso ego e dos egos ao nosso redor, acabo percebendo que é a escrita que me domina e não os acontecimentos, ainda que pareça que ela acontece para vos contar coisas... sim, é para isso, também. Mas, na verdade, é como se tivesse sido quebrado o filtro do julgamento, da restrição, da avaliação pessoal e alheia, e, finalmente, o que fica registado tem um propósito que nem eu descubro qual, mas precisa sair. E ser partilhado, porque mais do que precisar de sair, precisa chegar.

Claro que não chegará a todos, porque essa é outra tranquilidade, finalmente absorvida. As massas têm um propósito ilusório de grandiosidade que não me convence nem ilude, já. A não ser as “al dente” com o melhor “aglio e olio peperoncino”... E parmesão, claro;-)
Não será alheio a este filtrar, o número de palavras  e letras que percebo no fim de cada texto, um teste de resistência a uma maioria que nem a este parágrafo chega. Não julguem que se trata de seleção, segregação ou algo do género. Nem me reconheço esse direito. É apenas a consciência que o caminho para se aprofundar seja o que for, se for muito rápido, muito ligeiro, muito geral, é certo que será, com grande certeza, efémero, também.

Mas voltando à transparência...
Muitos advogam a importância de se ficcionar uma figura publica, que não só proteja a pessoa que lhe dá forma, como seduza inequivocamente um público sedento de quem lhes reproduza os sonhos e fantasias pessoas.
Outros defendem que, sem alimentar os fãs com os mais ínfimos detalhes da vida real do alvo da sua admiração, o esquecimento será o mais provável dos desfechos.
E outros ainda, sem estratégias ou manipulações, têm simplesmente um curso de acontecimentos onde nada disso importa, porque o nível do seu trabalho e a particularidade do seu público não se desviam do foco da sua Arte. E nem uns revelam muito, nem os outros precisam de mais do que recebem.

Na verdade descubro que estou fora de todas estas categorias, porque apesar das semelhanças com a última, se não houvesse quem lesse o que escrevo e pontualmente partilho, também este texto não tinha qualquer sentido:-)

E finalmente, percebo o porquê deste regresso à transparência e ao “ser-me”. Depois de entrar acidentalmente no universo da Música, de me contagiar em cada poro com o Fado, de me comprometer de forma incondicional com os seus meandros, de me perceber oficialmente Artista, profissional, dedicada e colectada nas Finanças enquanto trabalhador independente e empresária na área das artes, percebo que por maior respeito que tenha à minha Profissão, tenho infinitamente mais à minha Pessoa.

E é a Pessoa que sou, por dentro da Artista, da Amiga, da Mulher, da Filha, da Irmã, da Tia, que me ocorre partilhar. Não há milímetro da história de quem me rodeia que não tenha a autorização dos identificados, para estar. Como não há milímetro que escolha partilhar que me vulnerabilize, por mais indistinta que possa parecer a fronteira do profundo e do Muito profundo. A minha vulnerabilidade, os meus receios, os meus medos, são cada vez mais as minhas forças. Porque como sou eu, e lá vou aprendendo a “gostar-me”, não é que lhes tenho certa afeição, agora que as reconheço?

Aos indiferentes não fará nem mal, nem bem, nem diferença nenhuma.
Aos mal intencionados, saberão mais que nunca a beleza da Boa Intenção, que será o único retorno que terão.
Aos duvidosos trará a percepção de quão criativa, curiosa e “desinstaladora” a dúvida pode ser. A maior parte da minha visão tem raíz em dúvidas profundas com que me fui deparando toda a minha vida. Até descobrir que também não eram as certezas que me faziam falta... enquanto fui da dúvida à certeza perdi um precioso tempo de convivência com a realidade. Simples.

E aos que descobrem algum sentido e sintonia no que vivo e partilho, poderá significar uma infinidade de coisas tão importantes quanto sabermos que não estamos sós. Poderá ter uma pequena chave que faça a diferença em algum momento. Uma dica que sirva de bóia para algum naufrágio. Poderá ser qualquer coisa de útil. Oxalá.
Mas ser-me em absoluto silêncio, privacidade, segurança e recato, pareceu-me , finalmente, um desperdício de uma Vida Boa…


Façam, por isso, bom proveito de mim.

1 comentário:

  1. Mafalda, tropecei, afortunadamente, neste seu blog...e só para lhe comentar que até com prosa faz fado!!! :))) bem haja!

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